UMA
SOBREVIVENTE — A ROUBADORA DE LIVROS NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL
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“(...)
— Uma
pequena teoria —
As
pessoas só observam as cores do dia no começo e no fim, mas, para mim, está
muito claro que o dia se funde através de uma multidão de matizes e entonações,
a cada momento que passa. Uma só hora pode consistir em milhares de
cores diferentes. Amarelos céreos, azuis borrifados de nuvens. Escuridões enevoadas.
No meu ramo de atividade, faço questão de notá-los.
Já que aludi a ele, o único dom que me salva
é a distração. Ela preserva minha sanidade. Ajuda-me a aguentar,
considerando-se há quanto tempo venho executando este trabalho. O problema é:
quem poderia me substituir? (...) Nem preciso dizer que tiro férias à
prestação. Em cores.
Mesmo assim, é possível que você pergunte:
por que é mesmo que ela precisa se distrair? De que precisa se distrair?
O que me traz à minha colocação seguinte.
São os humanos que sobram.
Os sobreviventes. (...) Procuro deliberadamente
as cores para tirá-los da cabeça, mas, vez por outra, sou testemunha dos que ficam
para trás, desintegrando-se no quebra-cabeça do reconhecimento, do desespero e
da surpresa. Eles têm corações vazados. Têm pulmões esgotados. (...) É a
história de um desses sobreviventes perpétuos — uma especialista em ser deixada
para trás.
É só uma pequena história, na verdade, sobre,
entre outras coisas:
Uma
menina
Algumas
palavras
Um
acordeonista
Uns
alemães fanáticos
Um
lutador judeu
E uma
porção de roubos.
Vi
três vezes a menina que roubava livros.”
(ZUSAK, Markus. A Menina que Roubava Livros. Rio de Janeiro: Intrínseca. 2007. pp. 10-11.)
Escolhi
um dos livros que mais me emocionou, cuja história eu não tinha lido até o
final de 2011, mas há anos comprei, só pelo título, pois, afinal, eu também, se
estivesse na situação da Liesel, roubaria livros.
Este livro chama a atenção, primeiro, por ter
uma personagem singular: a Morte. E é só isso que está escrito na parte de trás
do mesmo. Nem sinal de sinopse, somente uma frase curtíssima, já falando quem é
a narradora.
Durante a leitura, eu não tinha nenhuma ideia
de quem era o escritor Markus Zusak, mas este único exemplar de sua obra já me
bastou para tornar-me muito, mas muito mesmo, fã da história e do autor. Li e
reli milhões de vezes durante o ano, ri, chorei, me enraiveci com o Markus, e
etc., mas o que me impressionou foi que me senti realmente como se fosse a protagonista, era como se eu visse o que estava escrito. Cada parágrafo, frase, palavra, era uma cena. E, falando nisso, estou ansiosa para conferir se, de verdade, o livro vai virar adaptação cinematográfica, espero que logo.
Uma coisa interessante, que ninguém faz, são os pormenores que ele dá, ou seja, detalhes que a própria Morte conta, às vezes de algo que não sabemos. Pequenos diálogos entre os personagens, significados de palavras, ironias, comentários da narradora, até mesmo, como dizer, "miragens". Todos eles são tesouros para a compreensão do livro.
Agora, passando o momento de explicação e
elogios, vamos ao resumo da obra.
Liesel é uma garota alemã de dez anos, que,
durante a Segunda Guerra, viaja com a mãe e o irmão mais novo a Molching, pois
será adotada por uma família. Durante a viagem, o menino morre, e então há-de
se parar para enterrá-lo. Após o enterro, caminhando com a mãe, Liesel percebe
que há algo escondido na neve. Descobre que é um livro, “O Manual do Coveiro”.
Ela praticamente não sabe ler, mas pega-o e o esconde.
Chegando à casa da família que a adotaria, ela
dá-se melhor com o seu pai de criação, Hans Hubermann, acordeonista cuja mulher
é rabugenta, mas tem um bom coração. Hans a ensina a ler aos poucos, depois de
descobrir o livro roubado, à noite, pois ela acorda com pesadelos, e na
madrugada o pai é o seu professor.
Passado um tempo, ela conhece Rudy Steiner,
que se torna seu melhor amigo, e ele acaba se apaixonando por ela, mas o garoto nunca recebe o beijo. Os dois, como é de se esperar, vivem se metendo
em enrascadas, e numa dessas ele a ajuda a roubar outro livro. A partir daí,
ela passa a ser conhecida, oficialmente, como “a menina que roubava livros”.
A Morte continua a descrever a vida da
menina, e depois de quase dois anos da chegada de Liesel, aparece na porta da casa dos Hubermann um
rapaz, Max Vandenburg, judeu filho de alguém a quem Hans prometeu algo, e pintou a casa do pai do mesmo quando Max era menino. Hubermann era
chamado “o pintor de casas judias”, sempre pintava as casas dos judeus alemães quando
eram pichadas; por isso o Partido Nazista negava-se à sua candidatura, enquanto
o seu filho era adepto ao mesmo e criticava o pai. Hans acolhe Max em sua casa,
no porão, enquanto Rosa, esposa do primeiro, reclama o tempo inteiro porque “podem
descobrir que abrigamos um judeu”.
Nossa roubadora de livros, embora, no
princípio, tenha medo de Max, acaba aproximando-se dele aos poucos, descobrindo
que ele também tem pesadelos, e conta-lhe os dela. Desde que ela disse ao pai que
“o cabelo dele parece de penas”, ele também se torna seu amigo. Max resolve
escrever uma pequena história, e dá-la à menina, depois do aniversário dela. A história foi escrita nas páginas do livro que salvou a vida dele. E o pior: é o
Mein Kampf. Por causa dele o Max consegue escapar da morte.
A parte que eu mais amo neste livro, é
exatamente essa. O Markus é um gênio por ter escrito uma obra desse porte.
Adoro os desenhos do Max, e os livrinhos que ele dá a Liesel.
Depois desses acontecimentos, o livro gira em
torno da preocupação da família em ser descoberta; os bombardeios às cidades;
os abrigos subterrâneos e a amizade de Liesel com o nosso Jesse Owens, Rudy; e o lutador judeu, que, vez em quando, sonha sair vencedor
em uma luta contra o Führer.
Por que ler A Menina que Roubava Livros? É simplesmente o livro mais
arrancador de lágrimas quanto de sorrisos, com os seus "saumensch"
e "saukerl" a toda hora; os roubos arrebatadores da
protagonista mais humana que já tive a honra de ler, e o pequeno mundo da Rua
Himmel, até os personagens chatérrimos, mas que nos abrem gargalhadas com os
palavrões e frases. Encerrando, um brilhante dizer do meu preferido Max, à
nossa ilustre ladra de livros.
"AS SAUDAÇÕES NATALINAS DE MAX VANDENBURG
- Muitas vezes, Liesel, eu gostaria que isso tudo acabasse, mas
aí, de algum modo, você faz uma coisa como descer ao porão carregando um boneco
de neve."
(ZUSAK, p. 277)
"(...) A menina que roubava livros via apenas a mecânica das palavras -
seus corpos presos ao papel, achatados para lhe permitir caminhar sobre eles.
Além disso, em algum lugar, nos hiatos entre uma frase e a maiúscula seguinte,
também havia Max. Liesel lembrou-se de ter lido para ele quando o rapaz
estivera doente. Será que ele está no
porão?, pensou com seus botões. Ou está roubando de novo um vislumbre do céu?
UMA
IDÉIA BONITA
Uma
roubava livros.
O outro
roubava o céu." (ZUSAK, p.333)
Sobre
o autor
Markus Frank Zusak (Sydney, 23 de junho de 1975) é um escritor australiano, famoso pelo seu best-seller internacional "A Menina que Roubava Livros".
Aos 30 anos, Zusak já se firmou como um dos mais inovadores e
poéticos romancistas dos dias de hoje.
Com a publicação de "A Menina que Roubava Livros", ele foi
batizado como um "fenômeno literário" por críticos australianos e
norte-americanos. Zusak é o autor vencedor do prêmio de quatro livros para
jovens: "The Underdog", "Fighting Ruben Wolfe",
"Getting the Girl", e "Eu Sou o Mensageiro", receptor de
um Printz Honor em 2006 por
excelência em literatura jovem.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Markus_Zusak
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07/01/2013
[RESENHA] A Menina que Roubava Livros - Markus Zusak
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Oi, Letícia!
ResponderExcluirNão sabia que a história acontecia durante a segunda guerra. Eu gosto muito de ler coisas relacionadas à esse momento.
Adorei sua resenha! Fiquei com vontade de lê-lo... Parece incrível!
Beijocas.
http://artesaliteraria.blogspot.com
Só digo uma coisa: LEIA. E ponto. É incrível mesmo, perdi a conta de quantas vezes reli. Acho que umas 5 (ou mais) haha :)
ExcluirNota mil! Um livro enquadrado num momento histórico da maior importância como foi a Segunda Guerra Mundial, será sempre fascinante. Um momento histórico, onde a morte é uma constante e os dramas sociais e humanitários um flagelo. Por tudo de mau e de bom que aconteceu, é gratificante saber que "a menina que roubava livros", se enquadra nessa época. O titulo só por si é enternecedor. E estar associado ao livro, remete-nos para o conhecimento, desafiando a ignorância. As personagens infantis, obriga a aventura e a questionar o porquê das coisas. São a inocência e a curiosidade que nos levam ao conhecimento mais profundo. Adorei todo o enredo disponível para leitura e fico ansiosa para ler o livro. Obrigada por esta tua partilha minha querida. Parabéns. Beijo....<3 E continua a mostrar o teu potencial literário, para que também nós nos possamos enriquecer. <3
ResponderExcluirObrigada, Nita, pela tua avaliação! O livro, aí em Portugal, está publicado pela Editorial Presença. Procura e lê. Beijo.
ExcluirEsse livro é realmente muito bom. Li uma vez, emprestado de uma amiga, mas não vejo a hora de comprar para poder reler. Ótima dica!
ResponderExcluirBeijos,
http://pitadadecultura.blogspot.com.br/
Oi Letícia!
ResponderExcluirAs passagens desse livro são ótimas mesmo, facilmente emocionam. Tenho vários quotes marcados como preferidos. Dá aquela vontade de reler...
Faz alguns anos já, desde que o li, mas me lembro de chorar histericamente ao final do livro hauahu
Eu nem faço questão de uma adaptação cinematográfica. Tem livros que eu acho que funcionam melhor apenas nas páginas mesmo, esse é um deles. Mas posso estar enganada, nunca se sabe.
Beijos!!
Não preciso dizer que este é um dos meus livros favoritos, não é mesmo. A cada coisa que leio sobre ele tenho vontade de pegá-lo da estante e reler. Infelimente tenho uma longa lista de livros pra ler e não vai ser tão já que irei relê-lo, se bem que fiz isso logo que saiu o trailer do filme. E passei por mais uma enxurrada de lagrimas e risos como você disse. Adoro a Liesel, mas depois de uma segunda leitura Max tornou-se meu personagem preferido, tudo pelo que ele passa é tão triste. Enfim amo essa história!
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