Postagens Recentes

Mostrando postagens com marcador teatro. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador teatro. Mostrar todas as postagens

19/03/2013

Estreia de "A Menina que Roubava Livros" - 2014



3 PERGUNTAS PARA MARKUS ZUSAK, O AUTOR DE A MENINA QUE ROUBAVA LIVROS





Markus Zusak por Bronwyn Rennix
Encenado no teatro pela primeira vez no ano passado, o livro A menina que roubava livrosde Markus Zusak, há 280 semanas na lista de best-sellers do New York Times, está perto de estrear no cinema.
Em primeira mão, Zusak nos contou as impressões de assistir a seus personagens ganharem vida na aclamada montagem da companhia de teatro Steppenwolf, de Chicago, e as expectativas para o filme. Com estreia prevista para 2014, a adaptação cinematográfica será dirigida por Brian Percival (Downton Abbeye estrelada por Sophie Nélisse (Liesel Meminger), Geoffrey Rush e Emily Watson. As filmagens já começaram em Berlim.

Cena da peça A menina que roubava livros. Foto: Kristyna Archer para o jornal The New York Times
Intrínseca — Recentemente, A menina que roubava livros foi adaptado para o teatro em uma montagem encenada em Chicago. Como você se sentiu ao ver Liesel, Rudy e Hubermanns ganharem vida? Como o desafio de ter a Morte como narradora foi resolvido?
Markus Zusak — A montagem, produzida pela companhia teatral Steppenwolf, foi realmente especial. No começo pensei que seria difícil de assistir, porque, de repente, está tudo lá, bem na sua frente. Diferentemente de como acontece com os livros, no teatro você não precisa imaginar. Eu estava preocupado se certas cenas iriam funcionar tão bem no palco como eu as havia imaginado no livro. Mas a peça é linda. E fez com que eu e os personagens nos orgulhássemos.
Quanto à Morte, a narradora, ela foi interpretada por um homem mais velho – uma personagem educada e cordial, mas que lidava muito bem com o seu trabalho…

Emily Watson, Sophie Nélisse e Geoffrey Rush.
I — Depois de seis anos o seu livro está sendo adaptado para o cinema. Você está participando da produção e da elaboração do roteiro de alguma forma? Quais são as suas expectativas com relação ao filme? O que você acha do elenco que foi definido?
MZ — Se alguém me dissesse, quando o livro foi negociado para o cinema, que Geoffrey Rush e Emily Watson seriam escolhidos para atuar no filme e que contratariam um grande diretor, eu teria achado graça. Estou muito entusiasmado. Não tinha como contribuir com o roteiro, além de lê-lo e de dar algumas sugestões, mas posso levar algum crédito por Sophie Nélisse, a atriz que interpretará Liesel. Eu a vi no filme Monsieur Lazhar e pensei: “Ela seria uma ótima Liesel.” E quando a sugeri aos produtores, eles logo a procuraram e ela acabou conseguindo o papel. Tenho certeza de que Nélisse se transformará completamente em Liesel e a tornará maravilhosa.
Sobre as expectativas: agora não tenho nenhuma. Estou tentando não pensar sobre isso e me concentrar para, finalmente, terminar meu livro novo!
I — Lionel Shriver, autora de Precisamos falar sobre o Kevin, disse certa vez que vender os direitos de um livro para Hollywood é como vender a alma ao diabo — o resultado (bom ou ruim) não é de responsabilidade do escritor e se torna um produto totalmente diferente. Você concorda com esta afirmação?
MZ — Concordo que é bom você praticamente lavar as mãos e dizer: “Bem, agora é com você.” Para mim, porém, é mais como dar algo aos seus irmãos — alguém que é semelhante a você em alguns aspectos, mas totalmente diferente em outros. Você os ama, mas não tem certeza do que eles farão — e dá essa chance a eles de qualquer forma. Você confia a obra a eles porque sabe que o resultado pode ser brilhante.

08/03/2013

Almeida Faria sobre Ariano Suassuna


Almeida Faria (centro) e Ariano Suassuna (dir.) na palestra sobre Utopia, Messianismo e Sebastianismo. VIII Fliporto - Olinda, Pernambuco, Brasil. 16/11/2012. 

                                     A espera cíclica de uma solução 
O escritor português Almeida Faria conversou com o blog literário e nos falou da sua admiração por Ariano Suassuna, que estará ao seu lado numa das mesas da Fliporto e da força da expressão “sebastianismo” no mundo atual.
1 – O senhor poderia falar um pouco da sua impressão em relação à obra de Ariano Suassuna, que estará ao seu lado numa das mesas da Fliporto?
 - A minha relação com a obra de Suassuna começou vai para meio século e vem progredindo por saltos e acasos. Em mil novecentos e sessenta e quatro, por um golpe de sorte, descobri num alfarrabista da Rua do Poço dos Negros, em Lisboa,Uma Mulher Vestida de Sol, sua primeira peça. O poético título, inspirado noApocalipse, levou-me a comprar sem hesitar aquela edição da Universidade do Recife, de capa amarelo torrado, com um sol vermelho baço sobre fundo acastanhado.
Tinha eu vinte e poucos anos, publicara dois romances e sonhava escrever teatro. Porém, no Portugal de então, havia um óbice capaz de desencorajar quaisquer veleidades teatrais: a imprensa periódica, o cinema e o teatro eram submetidos a uma férrea Censura Prévia. A ditadura de Salazar achava que, num país maioritariamente analfabeto, mais perigosos e potencialmente mais subversivos que os livros eram alguns espectáculos. Autores como Sartre, Peter Weiss e outros não eram encenáveis nem, nalguns casos, publicáveis. Assim se explica que boa parte da minha geração desconhecesse Suassuna até ao sucesso doAuto da Compadecida. O qual, graças às mil maravilhas do You Tube, vi no meu computador.
Por uma dessas coincidências que o surpreendente espectáculo da vida por vezes nos reserva, há anos viajei com Selton Mello, o Chicó pícaro da mais recente versão do Auto da Compadecida, num voo São Paulo-Rio. Ambos tínhamos assistido na véspera, em São Paulo, à antestreia de Lavoura Arcaica, filme baseado no romance de Raduan Nassar, amigo de longa data, em que Selton era o protagonista.
Das muitas peças de Suassuna, li mais três além da primeira: O Santo e a Porca,na qual Santo António, o casamenteiro de Lisboa ou de Pádua (tanto faz) é um excelente exemplo de „graça e astúcia cabocla“ (palavras de Carlos Drummond de Andrade); O Casamento Suspeitoso; e, enfim, A Pena e a Lei.
Em mil novecentos e sessenta e oito, sendo eu escritor residente nos Estados Unidos, palestrei em diversas universidades e numa delas conheci um bem disposto professor brasileiro que me contou como começara a sua fugaz carreira teatral encarnando a personagem de Joaquim na montagem inicial de A Pena e a Lei no Teatro do Parque, aqui ao lado.
Nos anos setenta comprei o Romance d´A PEDRA DO REINO e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta, cuja epígrafe de abertura é uma frase atribuída a „DOM SEBASTIÃO, O DESEJADO – Rei de Portugal, do Brasil e do Sertão“. As maiúsculas do título e da epígrafe não são minhas, são da edição original que anotei e sublinhei.
Estas sucessivas aproximações às ficções de Suassuna dão-me a impressão de conhecê-lo já há décadas. Na verdade, nunca nos encontrámos.
- Em que medida a expressão “sebastianismo” ainda decifra o povo português ou mesmo o brasileiro, já que tivemos movimentos de sebastianismo ao longo da nossa história?
- Não sei se "decifra" ou não. Quanto aos portugueses, o sebastianismo é uma forma de messianismo, é a espera cíclica de uma solução vinda de fora, uma frágil fé ou esperança a que nos agarramos em momentos de aflição. D. Sebastião foi um pobre-diabo e uma figura trágica. O príncipe D. João, seu pai, morreu aos dezasseis anos, antes mesmo de o filho nascer. A mãe, Dª Joana de Áustria, filha do imperador Carlos V e portanto irmã de Felipe II, rei de Espanha, casou aos dezanove anos e ficou viúva menos de um ano depois. Cumprido o dever de dar um herdeiro à coroa portuguesa, regressou a Madrid onde fundou o mosteiro das Descalças Reais para ela própria e nele viveu até morrer. Nunca mais viu o filho. Já em criança cognominado o Desejado, órfão de pai e abandonado pela mãe, D. Sebastião foi educado pelos jesuítas e pela avó, Dª Catarina de Áustria, num caldo cultural que o levou a sonhar ser um herói, virgem como Galahad e imortal como outros cavaleiros da Távola Redonda. Tinha vinte e quatro anos quando, para escapar à obrigação de casar, decidiu sem mais nem quê ir atacar os “infiéis” no Norte de África Em Agosto de 1578, após uma viagem em centenas de barcos, à frente de um exército parcialmente formado por milhares de mercenários de toda a Europa, o incauto rei, perseguindo o “inimigo” que fingia fugir dele, avançou deserto a dentro. Sob um sol fulminante, com homens e cavalos sequiosos, exaustos, num lugar chamado Alcácer Quibir, os cristãos foram em poucas horas massacrados e o rei nunca mais foi visto. Alguns dos grandes do reino, distinguíveis pela riqueza das armas e armaduras, e pela raça e jaezes dos cavalos, foram poupados a fim de serem trocados por rendosos resgates. Como a nobreza devia morrer pelo rei ou com o rei, os sobreviventes fizeram constar que o rei desaparecera, que se tornara Encoberto e iria voltar. O país inteiro ficou à espera dele. Sem filhos nem irmãos, o seu sucessor mais próximo era o tio e primo em segundo grau, Felipe II, rei de Espanha e de um mundo “onde o sol nunca se punha”. Melhor que eu aqui em duas linhas, o poeta Hans Magnus Enzensberger conta aliás esta história sebástica, em discurso direto que me é atribuído, num dos brilhantes ensaios de Ach Europa! (A Outra Europa. Impressões de sete países europeus, com um epílogo de 2006, na edição brasileira da Companhia das Letras). O primeiro profeta do Encoberto foi o visionário Bandarra, um sapateiro nascido em Trancoso no ano em que os portugueses chegaram ao Brasil. Retomando a lenda céltica de um rei adormecido numa ilha envolta em névoa, publicou as Trovas anunciando a vinda do rei Encoberto. Naqueles turvos tempos de Contra- Reforma, boa parte da Igreja Católica preferia a santa ignorância, e quem conhecesse um pouco do Antigo Testamento era suspeito. Acusado de judaísmo, o sapateiro foi preso e levado, em 1541, numa das sinistras procissões que antecediam os autos-da-fé. Não se sabe porquê, escapou à fogueira. No século seguinte surgiu o missionário do sebastianismo, aquele luso-brasileiro Padre Vieira a quem Fernando Pessoa chamou “imperador da língua portuguesa”. Igualmente perseguido e preso pela Inquisição, valeu-lhe a proteção do rei, que o mandou em secretas e delicadas tarefas diplomáticas à Holanda e a Roma. Regressado a Portugal, teve o cuidado de deixar inédito o magno tratado milenarista e bíblico intitulado História do Futuro. Mais perto de nós, o mito encontrou o seu mais inspirado defensor em Fernando Pessoa, que põe na boca do Desejado a defesa da sua orgulhosa loucura:
Louco, sim, louco porque quis grandeza Qual a sorte a não dá (…) Sem a loucura, que é o homem Mais que a besta sadia, Cadáver adiado que procria.
No meu romance O Conquistador narro o aparecimento fantástico de uma criança fisicamente semelhante a D. Sebastião, na manhã enevoada de um dia de São Sebastião, vinte de Janeiro, dia do nascimento do rei. O incipit romanesco acontece a vinte de Janeiro de 1954, quatro séculos exatos, dia por dia, sobre a data em que nasceu o Desejado. Mas o meu protagonista tem outras ambições, e são outras as suas conquistas. Em manhãs de nevoeiro ouve-se aqui dizer que é um dia ideal para D. Sebastião voltar. E hoje mesmo, 3 de novembro, no Público, o mais prestigiado diário português, o acutilante cronista Vasco Pulido Valente termina assim o seu artigo de opinião sobre a desgraça financeira e política do país: “Se alguém encontrar D. Sebastião numa manhã de nevoeiro, por favor escreva para este jornal.”